segunda-feira, 18 de abril de 2011

Santos futebol clube - Kleber Nunes

Santos sempre santos,
Santos que só faz bem,
Ver-te jogando é tão bom,
Tem craques como ninguém.

Teu centenário é uma festa,
Tua história também,
Teu orgulho é preto e branco,
Camisa como a tua não tem.

O mar da cidade te reverencia,
A brisa que vem de lá te quer bem,
És o amor de gerações,
Um astro que se mantém.

Tua sina é ganhar sempre,
Teu destino é fazer gols,
És uma fábrica de craques,
Que o tempo eternizou.

Maior que ti não houve ou há,
Comparação não se convém,
És o maior do futebol,
Tua história ninguém tem.

Cem anos de luta e glórias,
Melhor ataque e paixão,
És praiano e alvinegro,
O clube do coração.

Um dia de praia - Kleber Nunes

Mar de Domingas Dias,
Dias de sol e calor,
Água de côco e arrepio,
Vento repleto de amor.

Água cristalina rara,
Beleza atlântica florida,
Toalha molhada e areia,
Descanso de palha e bebida.

Curvas da estrada na volta,
Pele queimada e bonita,
Sono gostoso de tarde,
Rede esperando vazia.

Santo no alto do morro,
Brisa que vem da janela,
Estrelas brilhando no alto,
E mais uma noite daquelas...

Quero tanto poucas coisas - Kleber Nunes

Quero tanto poucas coisas,
Coisas essas que me valem,
Quero aquilo que não sei,
Sei que quero e não tardo.

Busco hoje o amanhã,
Planto sonhos e não rego,
Minha terra só é fértil,
Quando o sonho não me nego.

Minhas mãos alcança o céu,
É só estendê-las ao alto,
Miro estrelas, conto astros,
Tenho tudo e me farto.

Quero tanto poucoas coisas,
Quero a vida, quero o alto,
Olhar para o futuro feliz,
Da riqueza, do inexato.

domingo, 17 de abril de 2011

Ao filho que ainda não temos - Kleber Nunes

 
Nosso querido filho distante, te esperamos com amor e prontos para conduzir-te nesse mundo difícil e cheio de riscos,
Temos certeza que tu vives num plano melhor do que esse aqui embaixo e por isso entendemos a negação tua de vir ao nosso encontro,
Nós também adoraríamos estar num mundo melhor e teríamos muito medo de abandonar nosso ambiente seguro pela incerteza de vivermos entre os ignorantes,
Mas não se esqueça que Deus é sábio filho, só ele e nós podemos te proporcionar o sofrimento na medida certa para um futuro melhor, não vamos desampará-lo nos momentos difíceis e não se esqueça que só podemos evoluir, mesmo que queiramos voltar,
Tua cama está pronta, sua comida está posta, o amor que você merece e precisa está guardado e nós estamos te esperando.

20/03/2011

Natureza cimentada - Kleber Nunes

Vi a planta nascer do cimento,
A árvore cercada,
Aprisionada,
Triste.

Natureza forte e teimosa,
Insiste em viver,
Vence o cimento e brota,
Verde e forte.

Inteligência faz sofrer - Kleber Nunes

Ser inteligente é sofrer,
Enxergar demais,
Decepcionar-se mais,
É doer.

Inteligência é saber,
Que expõe o coração,
Mas que encontra abrigo,
Em doar.

É melhor sofrer por saber,
É melhor conceber,
Oferecer,
Desconhecer é triste.

Amiga Tereza - Kleber Nunes

Anjo negro de voz firme,
Olhar expressivo,
Presença marcante,
Anjo que sobe e não cai.

Tua química exala conhecimento,
Conduz vidas,
Abre olhos,
Com tua aura amarela e elevada.

Anjo negro que divide,
Que oferta,
Que nada em troca pede,
Ao distribuir conhecimento.

Meu caminho cruzou o teu,
E meu espírito agradeceu,
Ah Minha essência!
Como melhorou depois de ti.

A escola do mundo te precisa,
Se tivéssemos mais Terezas,
Teríamos mundo melhor,
E o céu teria menos trabalho.

A paz que exalas é uma sina,
Tuas mãos de amor cura,
Sina sagrada essa tua,
De ser Tereza Cristina.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Querem uma luz melhor que o sol! - Alberto Caeiro


AH! QUEREM uma luz melhor que
a do Sol!
Querem prados mais verdes do que estes!
Querem flores mais belas do que estas
que vejo!
A mim este Sol, estes prados, estas flores contentam-me.
Mas, se acaso me descontentam,
O que quero é um sol mais sol
que o Sol,
O que quero é prados mais prados
que estes prados,
O que quero é flores mais estas flores
que estas flores -
Tudo mais ideal do que é do mesmo modo e da mesma maneira!
Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Aceita o universo - Alberto Caeiro

Aceita o universo
Como to deram os deuses.
Se os deuses te quisessem dar outro
Ter-to-iam dado.
Se há outras matérias e outros mundos
Haja.

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

A sua verdadeira realidade - Alberto Caeiro

Entre o que vejo de um campo e o que vejo de outro campo
Passa um momento uma figura de homem.
Os seus passos vão com "ele" na mesma realidade,
Mas eu reparo para ele e para eles, e são duas cousas:
O "homem" vai andando com as suas idéias, falso e estrangeiro,
E os passos vão com o sistema antigo que faz pernas andar.
Olho-o de longe sem opinião nenhuma.
Que perfeito que é nele o que ele é — o seu corpo,
A sua verdadeira realidade que não tem desejos nem esperanças,
Mas músculos e a maneira certa e impessoal de os usar.

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Esqueço do quanto me ensinaram - Alberto Caeiro

Deito-me ao comprido na erva.
E esqueço do quanto me ensinaram.
O que me ensinaram nunca me deu mais calor nem mais frio,
O que me disseram que havia nunca me alterou a forma de uma coisa.
O que me aprenderam a ver nunca tocou nos meus olhos.
O que me apontaram nunca estava ali: estava ali só o que ali estava.

Alberto Caeiro, in "Fragmentos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Nunca busquei viver a minha vida - Alberto Caeiro

Nunca busquei viver a minha vida
A minha vida viveu-se sem que eu quisesse ou não quisesse.
Só quis ver como se não tivesse alma
Só quis ver como se fosse eterno.
Alberto Caeiro, in "Fragmentos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Luiza - Tom Jobim

Rua,
Espada nua
Boia no céu imensa e amarela
Tão redonda a lua
Como flutua
Vem navegando o azul do firmamento
E no silêncio lento
Um trovador, cheio de estrelas
Escuta agora a canção que eu fiz
Pra te esquecer Luiza
Eu sou apenas um pobre amador
Apaixonado
Um aprendiz do teu amor
Acorda amor
Que eu sei que embaixo desta neve mora um coração

Vem cá, Luiza
Me dá tua mão
O teu desejo é sempre o meu desejo
Vem, me exorciza
Dá-me tua boca
E a rosa louca
Vem me dar um beijo
E um raio de sol
Nos teus cabelos
Como um brilhante que partindo a luz
Explode em sete cores
Revelando então os sete mil amores
Que eu guardei somente pra te dar Luiza
Luiza
Luiza

Aula de matemática - Tom Jobim

Pra que dividir sem raciocinar
Na vida é sempre bom multiplicar
E por A mais B
Eu quero demonstrar
Que gosto imensamente de você

Por uma fração infinitesimal,
Você criou um caso de cálculo integral
E para resolver este problema
Eu tenho um teorema banal

Quando dois meios se encontram desaparece a fração
E se achamos a unidade
Está resolvida a questão

Pra finalizar, vamos recordar
Que menos por menos dá mais amor
Se vão as paralelas
Ao infinito se encontrar
Por que demoram tanto os corações a se integrar?
Se infinitamente, incomensuravelmente,
Eu estou perdidamente apaixonado por você


Esse teu olhar - Tom Jobim

"Esse teu olhar
Quando encontra o meu
Fala de umas coisas que eu não posso acreditar...
Doce é sonhar, é pensar que você,
Gosta de mim, como eu de você...
Mas a ilusão,
Quando se desfaz,
Dói no coração de quem sonhou,
Sonhou demais...
Ah, se eu pudesse entender,
O que dizem os seus olhos."

domingo, 10 de abril de 2011

Parei - Kleber Nunes

Hoje sou ativo, altivo e inteiro,
Tenho pressa e planos,
Sou ansioso e justifico,
Tenho certeza que devo correr.

Hoje quero mais de tudo,
Meus planos tem mais pressa e corro,
Busco incessantemente e sofro,
Tenho muito e acho pouco.

De repente cessa minha busca,
Acaba minha pressa,
Deixo de correr e deito,
Não há mais vida em meu peito.

Ontem tinha tudo e planos,
Tinha pressa e sonhos,
Não sabia de hoje,
Agora sei...

sábado, 9 de abril de 2011

Terra - Kleber Nunes

A dama caminhava pela planície verdejante,
E lançava ao solo sementes de frutos e flores,
Seu caminho de ida era triste e vazio,
Não havia plantas, flores nem frutas.

A dama caminhava sem destino,
Procurava por um mundo melhor,
Mais colorido,
Menos cinza.

A dama ouvia falar de lugares bonitos e floridos,
De fontes de águas cristalinas,
De árvores frondosas,
E de um mundo colorido.

A dama não olhou para trás durante um bom tempo,
Apenas lançava ao solo suas sementes e caminhava,
E nada a sua frente era bonito e florido,
Achava-se impotente diante de um mundo cinza.

A dama decidiu então olhar para trás,
E lá estavam as sementes lançadas ao solo,
Não eram mais sementes,
Tinham germinado e crescido.

Ela encontrou o lugar que procurava,
E descobriu que tinha tornado seu rastro melhor,
Ela criou o mundo que procurava,
E não foi em vão...

Corpo - Kleber Nunes

Corpo nú e belo,
Puro como no começo,
Tempo que não me lembro mais,
Tempo em que tu eras apenas parte do todo, e só.

Corpo objeto de desejo,
A cobiça dos homens passa por teu império,
Já não és apenas moradia da alma,
Tornaste o transporte do bem e do mal.

As vezes corpo, tu chegas a feder,
De tanto descaso do condutor que te leva,
Tua duração se encurta,
E quando se delonga, te arrastas para sobreviver.

Alguns te cultuam,
Te transformam,
Te faz diferente na marra,
Só porque acham bonito assim.

Aguanta firme moradia divina,
Um pedaço da criação reside em ti,
E por mais que mudem a fachada,
O que vai prevalecer é o interior da casa.

Sol - Kleber Nunes

Tão longe e tão perto,
Tão perto e tão fora do nosso alcance,
Queria poder tocá-lo,
E de olhos abertos contemplá-lo.

Sol supremo e único,
A luz que nos dá vida origina-se de ti,
O calor que nos aqueçe te pertence,
E o brilho de tua existência alegra nossos dias.

Nenhuma montanha seria bonita sem tua existência,
O azul do mar perderia sua cor,
O dia de domingo deixaria de ser especial,
E a vida que te aguarda em cada canto do mundo deixaria de existir.

De tudo que conhecemos tu és a essência,
Provedor de nossa existência,
Mantenedor da vida,
Único...

Canção do dia de sempre - Mário Quintana


Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...

Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...

E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...

E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.

Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.

Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!

E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...

Da discrição - Mário Quintana


Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo do teu amigo
Possui amigos também...

Da felicidade - Mário Quintana


Quantas vezes a gente,em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão,por toda parte,os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!

Das utopias - Mário Quintana


Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!

Do amoroso esquecimento - Mário Quintana


Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Meu destino - Cora Coralina

Nas palmas de tuas mãos
leio as linhas da minha vida.

Linhas cruzadas, sinuosas,
interferindo no teu destino.

Não te procurei, não me procurastes –
íamos sozinhos por estradas diferentes.

Indiferentes, cruzamos
Passavas com o fardo da vida...

Corri ao teu encontro.
Sorri. Falamos.

Esse dia foi marcado
com a pedra branca da cabeça de um peixe.

E, desde então, caminhamos
juntos pela vida...

Assim eu vejo a vida - Cora Coralina

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

Humildade - Cora Coralina

Senhor, fazei com que eu aceite
minha pobreza tal como sempre foi.

Que não sinta o que não tenho.
Não lamente o que podia ter
e se perdeu por caminhos errados
e nunca mais voltou.

Dai, Senhor, que minha humildade
seja como a chuva desejada
caindo mansa,
longa noite escura
numa terra sedenta
e num telhado velho.

Que eu possa agradecer a Vós,
minha cama estreita,
minhas coisinhas pobres,
minha casa de chão,
pedras e tábuas remontadas.
E ter sempre um feixe de lenha
debaixo do meu fogão de taipa,
e acender, eu mesma,
o fogo alegre da minha casa
na manhã de um novo dia que começa.”

Mãe - Cora Coralina


Renovadora e reveladora do mundo
A humanidade se renova no teu ventre.
Cria teus filhos,
não os entregues à creche.
Creche é fria, impessoal.
Nunca será um lar
para teu filho.
Ele, pequenino, precisa de ti.
Não o desligues da tua força maternal.

Que pretendes, mulher?
Independência, igualdade de condições...
Empregos fora do lar?
És superior àqueles
que procuras imitar.
Tens o dom divino
de ser mãe
Em ti está presente a humanidade.

Mulher, não te deixes castrar.
Serás um animal somente de prazer
e às vezes nem mais isso.
Frígida, bloqueada, teu orgulho te faz calar.
Tumultuada, fingindo ser o que não és.
Roendo o teu osso negro da amargura.

Nú - Manuel Bandeira



Quando estás vestida,
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.

(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.

Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.

Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.

Teus exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos -

Brilham.) Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!

Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.

Então, dentro deles,
Bóio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.

Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu'alma
Nua, nua, nua...

A Cópula - Manuel Bandeira

A Cópula

Depois de lhe beijar meticulosamente
o cu, que é uma pimenta, a boceta, que é um doce,
o moço exibe à moça a bagagem que trouxe:
culhões e membro, um membro enorme e turgescente.

Ela toma-o na boca e morde-o. Incontinenti,
Não pode ele conter-se, e, de um jacto, esporrou-se.
Não desarmou porém. Antes, mais rijo, alteou-se
E fodeu-a. Ela geme, ela peida, ela sente

Que vai morrer: - "Eu morro! Ai, não queres que eu morra?!"
Grita para o rapaz que aceso como um diabo,
arde em cio e tesão na amorosa gangorra

E titilando-a nos mamilos e no rabo
(que depois irá ter sua ração de porra),
lhe enfia cona adentro o mangalho até o cabo.

A arte de amar - Manuel Bandeira


Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.

Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

Fênix - Flávio Venturini / Jorge Vercilo

Eu!
Prisioneiro meu
Descobri no brêu
Uma constelação...
Céus!
Conheci os céus
Pelos olhos seus
Véu de contemplação...
Deus!
Condenado eu fui
A forjar o amor
No aço do rancor
E a transpor as leis
Mesquinhas dos mortais...
Vou!
Entre a redenção
E o esplendor
De por você viver...
Sim!
Quis sair de mim
Esquecer quem sou
E respirar por ti
E assim transpor as leis
Mesquinhas dos mortais...
Agoniza virgem Fênix
O amor!
Entre cinzas arco-íris
Esplendor!
Por viver às juras
De satisfazer o ego mortal...
Coisa pequenina
Centelha divina
Renasceu das cinzas
Onde foi ruína
Pássaro ferido
Hoje é paraíso...
Luz da minha vida
Pedra de alquimia
Tudo o que eu queria
Renascer das cinzas...
E eu!
Quando o frio vem
Nos aquecer o coração
Quando a noite faz nascer
A luz da escuridão
E a dor revela a mais
Esplêndida emoção...
O amor!
Quando o frio vem
Nos aquecer o coração
Quando a noite faz nascer
A luz da escuridão
E a dor revela a mais
Esplêndida emoção...
Quando o frio vem
Nos aquecer o coração
Quando a noite faz nascer
A luz da escuridão
E a dor revela a mais
Esplêndida emoção.

Lábios que não se abrem, lábios - Henriqueta Lisboa

Lábios que não se abrem, lábios


Lábios que não se abrem, lábios
com seu segredo
calado
 

Segredo no ermo da noite
resiste à rosa dos ventos
calado.
 

Flauta sem a vibração
do sopro.
Luar e espelho, frente a frente,
em calada
vigília.
 

Fria espada unida
ao corpo.
 

Resto de lágrimas sobre
lábios
calados.
 

Borboleta da morte
em sorvo
pousada à flor dos lábios
calados
calados.

Publicado: A Face Lívida (1945)

Esse despojamento - Henriqueta Lisboa


Esse despojamento
esse amargo esplendor.
Beleza em sombra
sacrifício incruento.
 

A mão sem jóias
descarnada
na pureza das veias.
A voz por um fio
desnuda
na palavra sem gesto.
 

O escuro em torno
e a lucidez
violenta lucidez terrível
batida de encontro ao rosto
como uma ofensa física.
 

Na imensidade sem pouso,
olhos duros
de pássaro.

Publicado: A Face Lívida (1945)

De súbito cessou a vida - Henriqueta Lisboa


De súbito cessou a vida.
Foram simples palavras breves.
Tudo continuou como estava.
 

O mesmo teto, o mesmo vento,
o mesmo espaço, os mesmos gestos,
Porém como que eternizados.
 

Unção, calor, surpresa, risos
tudo eram chapas fotográficas
há muito tempo reveladas.
 

Todas as cousas tinham sido
e se mantinham sem reserva
numa sucessão automática.
 

Passos caminhavam no assoalho,
talheres batiam nos dentes,
janelas se abriam, fechavam.
 

Vinham noites e vinham luas,
madrugadas com sino e chuva.
Sapatos iam na enxurrada.
 

Meninas chegavam gritando.
Nasciam flores de esmeralda
no asfalto! mas sem esperança.
 

Jornais prometiam com zelo
em grandes tópicos vermelhos
o fim de uma guerra. Guerra?...
 

Os que não sabiam falavam.
Quem não sentia tinha o pranto.
(O pranto era ainda o recurso
de velhas cousas coniventes.)
 

Nem o menor sinal de vida.
Tão-só no fundo espelho a face
lívida, a face lívida.

Publicado: A Face Lívida (1945)

Assim é o medo - Henriqueta Lisboa


Assim é o medo:
cinza
Verde.
Olhos de lince.
Voz sem timbre
Torvo e morno
Melindre.

Da sombra espreita
à espera de algo

que o alente.
Não age: tenta
porém recua
a qualquer bulha.

No campo assiste
junto ao títere
à cruz que esparze
vivo gazeio
de nervosismo
com vidro moído
grácil granizo
de pássaros.

E que rascante
violino brusco
não arrepia
ao longo o azul
dos meus veludos
se, a noite em meio
cá no fundo
quarto escuro,
a lua arrisca
numa oblíqua
o olhar morteiro.

Dentro da jaula
(mundo inapto)
do domador
em fúria à fera
subsinuosa-
mente resvala.

Aos frios reptos
do ziguezague
em choque, súbito
relampagueio,

as duas forças
se opõem dúbias
se atraem foscas
para a luta
pelo avesso:
despiste e fuga
ouro e vermelho
desde a entranha.

As duas forças
antagônicas:
qual delas ganha
acaso
ou perde
o medo
frente a
frente ao
medo?


Publicado: Além da Imagem (1963)

domingo, 3 de abril de 2011

Ir e vir - Kleber Nunes

Tudo é tão intenso,
Viver, morrer e voltar,
Há tantas teses sobre esse ir e vir,
Por enquanto eu quero ficar.

Alma - Kleber Nunes

Não entendo minha alma,
Tento caminhar no mesmo sentido que ela,
Mas na maioria das vezes me sinto puxado,
Como se estivéssemos andando em sentidos contrários.

As vezes essa sensação é sufocante,
Causa um mal estar que remédio nenhum é capaz de curar,
Procuro em vão nas coisas que vejo e posso tocar,
Uma solução imediata que alivie essa dor.

Oh alma amada que habita meu ser,
Sei que é dificil sua estadia num corpo tão imperfeito,
Se eu pudesse libertá-la o faria,
Daria a você a oportunidade de voltar ao eter.

Preciso de ti alma amiga,
Tua presença em meu âmago é o que me da esperança,
De ti é que vem meus desejos celestiais,
Se um dia serei melhor é porque a tenho.

Alma milenar que me habita,
Minha mais velha amiga,
Minha única decente hospedeira,
Preciso te sentir a flor da pele e exteriorizar-te.

Minha agonia termina,
Sempre que a percebo em mim,
Não só como uma parte do cosmo que em mim habita,
Mas como parte integrante do meu ser.

Talvez essa ângustia que por vezes sinto,
Seja porque tu és maior do que eu,
E por isso me aperta o peito,
Mas por ser tão grande, acalenta meu coração.

sábado, 2 de abril de 2011

É preciso sofrer - Kleber Nunes

Pra ser feliz é preciso sofrer,
Não faz sentido alegrar-se do nada,
O sentimento de alegria sempre vem depois do sofrimento,
Como um alívio emprestado por Deus.

A felicidade não é uma certeza constante,
Ela é um estado, um momento,
Estar feliz é passageiro,
Mas a certeza da morte é constante.

Talvez o universo tenha errado a dose,
A pitada de coisas tristes foi maior,
A dose exata da alegria se perdeu,
Ajustar e acertar a receita ficou para nós.

Já que não é possível viver a certeza da alegria da hora seguinte,
Vibro e torço por mais momentos de felicidades,
Planto uma árvore, escrevo um livro, ajudo um velhinho a atravessar a rua,
E tento com tudo isso viver dias melhores.

Procuro a cada gesto e a cada palavra,
Convencer o universo que mereço dias melhores,
Mas a criação sabe tudo,
E só recebo o que mereço.

Por isso não sou santo nem demônio,
Oscilo entre uma coisa e outra,
Ora choro, ora riu,
E de vez em quando sou feliz.

Eros e Psique - Fernando Pessoa

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

Monólogo de Orfeu - Vinicius de Moraes e Tom Jobim

 
Mulher mais adorada!
Agora que não estás,
deixa que rompa o meu peito em soluços
Te enrustiste em minha vida,
e cada hora que passa
É mais por que te amar
a hora derrama o seu óleo de amor em mim, amada.
E sabes de uma coisa?
Cada vez que o sofrimento vem,
essa vontade de estar perto, se longe
ou estar mais perto se perto
Que é que eu sei?
Este sentir-se fraco,
o peito extravasado
o mel correndo,
essa incapacidade de me sentir mais eu, Orfeu;
Tudo isso que é bem capaz
de confundir o espírito de um homem.
Nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga,
esse contentamento, esse corpo
E me dizes essas coisas
que me dão essa força, esse orgulho de rei.
Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música.
Nunca fujas de mim.
Sem ti, sou nada.
Sou coisa sem razão, jogada, sou pedra rolada.
Orfeu menos Eurídice: coisa incompreensível!
A existência sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos.
Tu és a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo,
minha amiga mais querida!
Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! Criatura!
Quem poderia pensar que Orfeu,
Orfeu cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres -
que ele, Orfeu,
Ficasse assim rendido aos teus encantos?
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho
que eu vou te seguindo no pensamento
e aqui me deixo rente quando voltares,
pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que estarei contigo.
 

Modinha - Tom Jobim e Vinicius de Moraes

Não, não pode mais meu coração
Viver assim dilacerado
Escravizado a uma ilusão
Que é só desilusão
Não, não seja a vida sempre assim
Como um luar desesperado
A derramar melancolia em mim
Poesia em mim
Vai, triste canção, sai do meu peito
E semeia emoção
Que chora dentro do meu coração

Boa música - Kleber Nunes

O que pode ser mais lindo do que o som de um piano,
Uma voz limpa e suave de acompanhamento,
Um violino solando,
E um momento apropriado.

Música proporciona magia,
Nos leva a lugares novos e distantes,
Penetra nossa alma sem pedir licença e se instala,
Geralmente no coração.

Não é possível não se render,
Aos encantos da boa música,
Na poesia contida em suas letras há riquezas,
Algumas músicas fazem o céu descer até nós, isso quando não subimos até ele.

Gente Humilde - Chico Buarque e Vinicius de Moraes

Tem certos dias
Em que eu penso em minha gente
E sinto assim
Todo o meu peito se apertar
Porque parece
Que acontece de repente
Como um desejo de eu viver
Sem me notar
Igual a tudo
Quando eu passo no subúrbio
Eu muito bem
Vindo de trem de algum lugar
E aí me dá
Como uma inveja dessa gente
Que vai em frente
Sem nem ter com quem contar
São casas simples
Com cadeiras na calçada
E na fachada
Escrito em cima que é um lar
Pela varanda
Flores tristes e baldias
Como a alegria
Que não tem onde encostar
E aí me dá uma tristeza
No meu peito
Feito um despeito
De eu não ter como lutar
E eu que não creio
Peço a Deus por minha gente
É gente humilde
Que vontade de chorar

Luar do sertão - Catulo da Paixão Cearense


Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão
Não há,ó gente,ó não
Luar como esse do sertão
Oh!que saudade do luar da minha terra
Lá na terra branquejando folhas secas pelo chão
Este luar cá da cidade tão escuro
Não tem aquela saudade do luar lá do sertão
Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão
Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão
Se a lua nasce por detrás da verde mata
Mais parece um sol de prata prateando a solidão
E a gente pega na viola que ponteia
E a canção e a lua cheia a nos nascer do coração
Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão
Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão
Mas como é lindo ver depois por entre o mato
Deslizar calmo regato,tranparente como um véu
No leito azul das suas águas murmurando
E por sua vez, roubando as estrelas lá do céu
Não há, ó gente, ó não,
Luar como esse do sertão
Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão

Tristesse - Milton Nascimento

 
Como você pode pedir
Pra eu falar do nosso amor
Que foi tão forte e ainda é
Mas cada um se foi
Quanta saudade brilha em mim
Se cada sonho é seu
Virou história em sua vida
Mas prá mim não morreu
Lembra, lembra, lembra, cada instante que passou
De cada perigo, da audácia do temor
Que sobrevivemos que cobrimos de emoção
Volta a pensar então
Sinto, penso, espero, fico tenso toda vez
Que nos encontramos, nos olhamos sem viver
Pára de fingir que não sou parte do seu mundo
Volta a pensar então
Como você pode pedir...

Chama no coração - Flavio Venturini

Vem ver
Há um clarão da ma ... ta
Noite de vendaval
Você, onde estás?
Luar preso na fumaça
Chama no co ... ração
Você, onde estás?
A fúria, o pão
Tudo se vai na queima ... da
O luar, o chão
Tudo se vai na queima ... da
Vem ver incendeia a ser ... ra
Resta em nosso olhar
O mar que não vêm
No céu uma ave ne ... gra
Voa sem dizer
Você, onde estás?
Queimadas no palmeiral
Cinzas ao sol na clareira
O vento varrendo
Resta plantar no que res ... ta
Deito na terra se ... ca
Vai um condor no ar
Nem há de me ouvir
No céu uma nuvem pra ... ta
Chama no co ... ração
você, não estás?
A vida, a viola

Nascente - Beto Guedes

Clareia manhã
O sol vai esconder a clara estrela
Ardente, pérola do céu refletindo teus olhos
A luz do dia a contemplar seu corpo
Sedento, louco de prazer e desejos
Ardentes

Luz e mistério - Beto Guedes e Caetano Veloso

Oh! Meu grande bem
Pudesse eu ver a estrada
Pudesse eu ter
A rota certa que levasse até
Dentro de ti
Oh! meu grande bem
Só vejo pistas falsas
É sempre assim
Cada picada aberta me tem mais
Fechado em mim
És um luar
Ao mesmo tempo luz e mistério
Como encontrar
A chave desse teu riso sério
Doçura de luz
Amargo e sombra escura
Procuro em vão
Banhar-me em ti
E poder decifrar teu coração
És um luar
Ao mesmo tempo luz e mistério
Como encontrar
A chave desse teu riso sério
Oh grande mistério, meu bem, doce luz
Abrir as portas desse império teu
E ser feliz
 

Construção - Chico Buarque

Chico Buarque

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado
Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague

Mata virgem - Kleber Nunes

Será que ainda existe uma mata virgem,
Repleta de grandes e lindas árvores,
Longe do alcance do homem,
E com bichos em abundância?

Será que nela, se é que ainda existe,
A natureza consegue expor de verdade sua beleza intensa,
E proporciona aos seus hóspedes uma verdadeira casa,
Será que só existe paz e verdadeira beleza fora do nosso alcance?

Será...

Ouvir Nana ouvindo o mar - Kleber Nunes

Tenho um sonho simples e completo que nunca realizei,
Ouvir Nana Caymmi ouvindo e olhando o mar,
Sentado debaixo de uma árvore,
Quase cochilando...