domingo, 31 de julho de 2011

Defunto globalizado - Kleber Nunes


Era só mais um cadáver que chegava na funerária de seu Jair, um homem de 67 anos e muita experiência em arrumar os corpos de acordo com a vontade dos familiares, mas esse tinha algo estranho, havia um bilhete no bolso de seu jeans azul.
A experiência e o tempo de serviço do mestre da moda funerária não lhe permitia se impressionar com quase nada, ele já tinha visto de tudo e era convicto de que nada era capaz de impressioná-lo mas aquele bilhete no bolso do defunto o intrigava e ele não resistiu!
Depois de tantos anos seu Jair finalmente se deparou com algo inacreditável e a surpresa estava no pedido que constava no bilhete: “Enterre-me com meu celular e num cemitério com acesso a internet sem fio; se existir vida após a morte, como poderei continuar sem meu celular? Preciso seguir globalizado, mesmo que isso não me leve a nada.”

Saudade - Kleber Nunes


Saudade que invade,
Que arde,
Que dilacera,
Saudade...
Que queima,
Que sufoca,
Que mata,
Saudade...
Que se hospeda,
Que cansa,
Que desespera,
Que sorrateiramente cega,
E inutilmente insiste,
Saudade.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

A flor e o passarinho - Kleber Nunes



A rosa
Orvalhada revela
Que espera
Espera molhada
Pondera
Pudera...
Cadê ele?
Será que ele vem?
Exuberantemente espera
O passarinho!
Com seu voo rasteiro
Seu canto melódico
E seu beijo doce.

Brincando com as palavras - Kleber Nunes


Para alcançar o que quero,
Alitero,
Rimo,
Esquartejo a palavra,
Em significante e significado.
Me espelho no Pedro pedreiro,
Uso a métrica,
A paranomásia,
Alitero em P,
Alitero em B,
Sou subjetivo e objetivo.
Crio imagens,
Uso metáforas,
Invento estruturas,
E tento ser poeta.
Para escrever meu poema,
Evito os condicionamentos,
A rigidez da verdade,
As regras desnecessárias,
Escrevo e pronto.
Associo ao meu poema as conotações,
Utilizo assonância,
E repito os sons para dizer o que quero.
Sou concreto e realista,
Abstrato e poeta.
Falo de coisas próximas,
De coisas distantes,
E visito as constelações.
Para escrever meu texto,
Esclareço,
Desobedeço,
Ofereço,
Simplesmente,
Escrevo.
As vezes tento aliterar,
E sou descritivo,
As vezes tento rimar,
E também sou descritivo,
As vezes tento fantasiar,
E volto a ser descritivo.
Penso poder promover,
Algumas frases a poema,
Penso poder exercer,
O poder de envolver,
De fazer sofrer,
De fazer querer,
E escrevo.
Meu poema não tem compromisso,
É livre de preconceito,
E feito com amor.
Procuro combinar as palavras,
Tento fazê-las se encontrar,
Para rimar,
Para encantar,
Para alcançar,
Para servi-las no altar,
Dos que amam a poesia,
E dela se servem para saciarem a sede,
Sede que água nenhuma é capaz de saciar.
Nas palavras encontro tudo que preciso,
Delas me sirvo,
Encontro nas palavras todas as possibilidades,
Mato a saudade,
O céu me invade.
O poema me alimenta,
Me sustenta,
Me orienta.
Brincando com as palavras eu existo,
Meu ser se expande,
Minhas células se renovam,
E renasço...
Minha existência seria comprometida sem a poesia,
Com certeza eu seria menor,
Não veria as estrelas com os olhos que vejo,
O mar não teria o mistério que o torna mais lindo,
O céu seria dispensável,
E a morte apenas o fim.
Escrevendo me liberto,
Me engrandeço,
Me esclareço,
E enalteço...
Enalteço a vida,
Vida que tanto desejo,
Desejo de tocar,
Tocar a felicidade,
Felicidade materializada,
Materializada em amor.
Para escrever deixo fluir,
Sentimentos,
Deixo me dominar,
Por Sensações,
Me entrego às reflexões,
E não tenho medo,
Medo de colocar no papel,
O que emana da alma.
Viver é poético,
Acordar todos os dias é poético,
Acreditar em Deus é poético,
Ter um dia ruim é poético,
Até um velório pode ser poético.
Para tudo isso,
Precisamos entender as palavras,
Decifrá-las,
Empregá-las da melhor maneira possível.
A palavra morte pode significar o fim,
Mas também pode significar um novo começo.
A morte das coisas que acredito é o fim,
Mas a morte dos meus equívocos o começo.
Escrever é falar da vida,
Romper barreira,
Superar limites,
Chegar onde a matéria não permite,
Estar ao mesmo tempo em lugares diferentes.
As palavras são a fonte da vida,
Elas nos norteiam,
Nos conduzem,
Nos ensinam,
E nos alimentam de cultura.
Felizes dos que podem consumi-las,
Felizes dos que fazem de cada dia uma nova oportunidade,
De através das palavras se fazer entender,
Conquistar seu espaço no universo,
Encontrar novas possibilidades,
E ser um pouco melhor.
Há um choro de lamento no ar,
Quanto aos que as ignoram,
Sobre os que as desdenham.
O universo lamenta o desprezo pelas palavras,
Porque sabe que o mundo seria melhor,
Se palavras fizessem parte,
De verdade,
Das nossas vidas.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Alma aprisionada - Kleber Nunes


Alma aprisionada,
Que busca,
Que almeja,
Que abriga a carne.
Alma que a matéria não impede,
Não limita,
Não diminui.
Alma que abriga o corpo,
Que é seu combustível,
Que é necessária,
E que se despede em silêncio,
Em anonimato,
E disposta.
Meu corpo é tua casa,
E tu meu templo sagrado,
Só alcanço o céu,
Quando alcanço...
Quando te deixo falar mais alto.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Voltar no tempo - Kleber Nunes


Se eu pudesse voltar no tempo!
E virar a direita,
Ao invés da esquerda.
E seguir em frente,
Ao invés de parar.
E calar a voz,
Ao invés de dizer o que pensava.
Se eu pudesse voltar no tempo!
E me permitir dormir mais tarde,
Ao invés de me preocupar com o dia seguinte.
E dizer mais sim,
Ao invés de tornar o não tão constante.
E despir-me dos equívocos,
Ao invés de imortalizá-los em mim.
Se eu pudesse voltar no tempo!
E viajar mais,
Ao invés de preferir a inércia do sofá.
E ter ido mais ao cinema,
Ao invés de render-me ao cabresto da televisão.
E ter trabalhado menos,
Ao invés de dedicar tanta energia em sonhos fúteis.
E ter feito mais amizades,
Ao invés de desacreditar na alma humana.
Se eu pudesse voltar no tempo!
Recomeçar...
Voltar ao aconchego do ventre,
Eu não voltaria!
Sou a soma dos erros,
Dos acertos,
Das dúvidas,
Das certezas,
O que vejo no espelho é justo.
O que tenho é realmente meu.
O que me falta,
Deixei de conquistar e ninguém me tirou.
Querer mudar o passado,
É zombar do universo.
E não assumir o compromisso,
De viver...

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O tempo - Kleber Nunes


Meu último passo...
Foi a menos de um segundo,
E já é passado!
O tempo é implacável.
Não espera por ninguém,
Não se atrasa,
Não chega antes,
Sempre existiu,
E no entanto, nunca envelhece.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Rotina - Kleber Nunes

Deus nos livre da rotina.

Do mesmo caminho,
Da mesma condução,
Do mesmo prato,
Da mesma faca,
Da mesma escova de dente,
Da mesma boca,

Sorte a nossa que temos os dentes.
Eles caem, se desgastam e podemos até substituí-los.
Seria um porre olhar para os mesmos a vida inteira.

Deus nos livre da rotina.

Do mesmo lado da cama,
Da mesma louça após as refeições,
Do mesmo chefe,
Do mesmo salário,
Do mesmo governo que só muda de nome,
Das mesmas promessas nos horários políticos,
Das mesmas decepções após cada promessa.

Azar o nosso que temos governos diferentes.
Promessas diferentes,
Descasos diferentes.
Porque não há novidade nisso,
É só mais uma rotina.

Inverno - Kleber Nunes

              Para uns,
              Aconchego de casa aquecida.
Para outros
Frio, descaso e relento.
Para uns,
Mantas macias e corpos acalentados.
Para outros,
Lençóis finos e corpos arrepiados .
Para uns,
Tempo de amar.
Para outros,
Tempo de sofrer.

O inverno chegou e as discrepâncias também!

O travesseiro confortável,
O quarto quentinho,
A sopa exalando cheiro bom no fogão,
A meia grossa de lã aquecendo o pé,
A manta, o sofa e a televisão...

Tudo isso contrasta!

Com o pedaço de espuma fina utilizado como travesseiro,
Com o barraco frio e umido,
Com a tampa do fogão abaixada porque não há sopa,
Com os pés descalços pela falta de meia,
Com a soma de retalhos costurados e chamados de cobertor.

Tempo de ajudar,
De doar,
De abraçar
De amar...

sábado, 2 de julho de 2011

Expressando amor - Kleber Nunes

Tocar o céu
Abraçar o mar
Envelopar a lua
Sentir o sol queimar dentro do peito e...
Inundar os pulmões de sentimentos.


Tudo isso é permitido aos que amam
Tudo isso é possível aos que descobrem nos sentidos das palavras
O endereço do amor.

Dores da alma - Kleber Nunes

Cadê?
Cadê?
A felicidade plena e constante
O amor que supera tudo
A justiça
O equilibrio

Onde estão essas coisas, como curar as dores da alma?

Sentimentos profundos...

Indignação hospedada no peito
Retrato decepcionado no espelho
Páginas em branco no livro da esperança
E pouca tinta para reescrever um novo caminho.

Cadê?
A fé que remove montanhas
A felicidade servida em bandeja
O amor imparcial
Onde estão os justos e mais uma vez cadê

Onde estão essas coisas, como curar as dores da alma?