segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Amar é... - Kleber Nunes


Amar é voltar atrás
Arrepender-se
Lamentar cada minuto distante
Cada lágrima proporcionada
Admitir-se metade

Amar é suar de ansiedade no frio
Sentir as mãos frias no calor
Iludir-se com o relógio
Querer ser tudo que o outro precisa
Ser inocente

Amar é ter ânsia de saudade
E não se contentar com nada
Não saciar-se com coisa alguma
É despedir-se da felicidade
Até que você chegue...

Quem sabe um dia - Kleber Nunes


Quem sabe um dia a pressa acabe
E nesse dia
Apreciar o nascer do sol
Se torne a refeição matutina
Quem sabe um dia o desamor termine
E nesse dia
Amar o próximo
Seja prazeroso e espontâneo
Quem sabe um dia cessem as lágrimas
E se persistirem
Que sejam nobres
Seus motivos.

Desejos - Carlos Drummond de Andrade

Desejo a vocês...
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho.
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu.

Choro bandido - Chico Buarque

Mesmo que os cantores sejam falsos como eu
Serão bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo miseráveis os poetas
Os seus versos serão bons
Mesmo porque as notas eram surdas
Quando um deus sonso e ladrão
Fez das tripas a primeira lira
Que animou todos os sons
E daí nasceram as baladas
E os arroubos de bandidos como eu
Cantando assim:
Você nasceu para mim
Mesmo que você feche os ouvidos
E as janelas do vestido
Minha musa vai cair em tentação
Mesmo porque estou falando grego
Com sua imaginação
Mesmo que você fuja de mim
Por labirintos e alçapões
Saiba que os poetas como os cegos
Podem ver na escuridão
E eis que, menos sábios do que antes
Os seus lábios ofegantes
Hão de se entregar assim:
Me leve até o fim
Mesmo que os romances sejam falsos como o nosso
São bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo sendo errados os amantes
Seus amores serão bons

Vagamente - Roberto Menescal

Só me lembro muito vagamente,
Correndo você vinha,quando de repente,
Seu sorriso que era muito branco...me encontrou
Só me lembro que depois andamos
Mil estrelas só nós dois contamos
E o vento soprou de manhã,mil canções...
Só me lembro,muito vagamente,
De tarde que morria ,quando de repente,
Eu sozinho,fiquei lhe esperando,e chorei,
Só me lembro muito vagamente,
O quanto a gente amou e foi tão de repente,
Que nem lembro se foi com você
Que eu perdi meu amor...

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Outra manhã - Beto Guedes

Outra manhã
Outra manhã já vem
Barco a procurar o cais

Não é o fim
Ontem não conta mais
Deita comigo nessa rede
Meu coração tem sede
E sempre quer
A mesma fonte serena que corre em
Seu olhar

Olha pra mim
Faz o verão voltar
Torna a cidade apaziguada
Apaga a luz da sala
Pra gente ver
Que tudo em volta se cala
O dia vai nascer

Pra outra direção o temporal se foi
Pra que lembrar, então por onde me arrastei?
Mas veja, meu bem, que a força desse amor pode fazer
alguém regressar
Trazendo outra manhã

Não é o fim
Pra quem se quer assim
Não há adeus pra se dizer
Olha pra mim
Faz o verão voltar
Torna à cidade apaziquada
Acende a luz da estrada
Tudo se vê
O absurdo se rende, o dia vai nascer

Pra outra direção o temporal se foi
Pra que lembrar então por onde me arrastei?
Mas veja, meu bem, que a força desse amor pode fazer
Alguém regressar
Trazendo outra manhã

Romance - Flávio Venturini

Flores simples enfeitando
A mesa do café
Lindas e pequenas,
Arco-íris num buquê
Mistério azul de luz
E Vênus brilha temporã
Mistura em nós um só destino
Estrela da manhã
Como num romance
Um Deus risonho aqui passou
Derramando cachoeiras
Pela serra em flor
Viver no coração da lenda
É fácil meu amor
Um sonho novo todo dia

Que ninguém sonhou
Canção de amor
Cintilando na janela aberta
Pro luar
Luzes da cidade refletidas
Num olhar
Constelações entre as antenas
Brincam de brilhar
Estrelas novas no horizonte
Vêm nos visitar
Como num romance
Um Deus risonho aqui passou
Numa nave cor da noite
Que ninguém notou
No coração da fantasia é fácil
Entender
Um sonho novo todo dia
Lindo de viver
Eu e você

Como num romance
Um Deus risonho aqui passou
Numa nave cor da noite
Que ninguém notou
Viver no coração da lenda
É fácil meu amor
Um sonho novo todo dia
Que ninguém sonhou

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Eu te amo - Chico Buarque

Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.

Olha Maria - Chico Buarque

Olha Maria
Eu bem te queria
Fazer uma presa
Da minha poesia
Mas hoje, Maria
Pra minha surpresa
Pra minha tristeza
Precisas partir

Parte, Maria
Que estás tão bonita
Que estás tão aflita
Pra me abandonar
Sinto, Maria
Que estás de visita
Teu corpo se agita
Querendo dançar

Parte, Maria
Que estás toda nua
Que a lua te chama
Que estás tão mulher
Arde, Maria
Na chama da lua
Maria cigana
Maria maré

Parte cantando
Maria fugindo
Contra a ventania
Brincando, dormindo
Num colo de serra
Num campo vazio
Num leito de rio
Nos braços do mar

Vai, alegria
Que a vida, Maria
Não passa de um dia
Não vou te prender
Corre, Maria
Que a vida não espera
É uma primavera
Não podes perder

Anda, Maria
Pois eu só teria
A minha agonia
Pra te oferecer

terça-feira, 18 de outubro de 2011

As canções que eu faço - Sa e Guarabyra

Se voce quer me conhecer, finja que toca comigo.
E faz comigo essas canções que eu faço.
E tem tanta coisa por dentro pra dizer.
Coisas que nao podem ser ditas de uma vez só
E sinta a solidão.
Que eu tenho quando canto uma canção bem alto
A solidao que eu tenho quando abro o coração e canto
Se voce quiser me entender
Ouça aquilo que eu nao digo
Nas entrelinhas das canções que eu faço.
Porque é que eu me guardo do mundo assim escondido
É coisa que só pode explicar quem vive o que eu vivo
E sinta a solidão, que eu tenho quando canto uma canção bem alto
A solidão que eu tenho quando abro o coração e canto.
E sinta a solidão que eu tenho quando canto uma canção bem alto.
A solidão que eu tenho quando abro o coração e canto

Vampiro - Caetano Veloso

Eu uso óculos escuros pras minhas lágrimas esconder
E quando você vem para o meu lado, ai, as lágrimas começam a correr
E eu sinto aquela coisa no meu peito
Eu sinto aquela grande confusão
Eu sei que eu sou um vampiro que nunca vai ter paz no coração
Às vezes eu fico pensando porque é que eu faço as coisas assim
E a noite de verão ela vai passando, com aquele seu cheiro louco de jasmim
E eu fico embriagado de você
Eu fico embriagado de paixão
No meu corpo o sangue não corre, não, corre fogo e lava de vulcão
Eu fiz uma canção cantando todo o amor que eu sinto por você
Você ficava escutando impassível e eu cantando do teu lado a morrer
E ainda teve a cara de pau
De dizer naquele tom tão educado
"oh! pero que letra más hermosa, que habla de un corazónapasionado"
Por isso é que eu sou um vampiro e com meu cavalo negro eu apronto
E vou sugando o sangue dos meninos e das meninas que eu encontro
Por isso é bom não se aproximar
Muito perto dos meus olhos
Senão eu te dou uma mordida que deixa na sua carne aquelaferida
Na minha boca eu sinto a saliva que já secou
De tanto esperar aquele beijo, ai, aquele beijo que nuncachegou
Você é uma loucura em minha vida
Você é uma navalha para os meus olhos
Você é o estandarte da agonia que tem a lua e o sol do meio-dia

Estrelas - Oswaldo Montenegro

Pela marca que nos deixa
A ausência de som que emana das estrelas
Pela falta que nos faz
A nossa própria luz a nos orientar
Doido corpo que se move
É a solidão nos bares que a gente frequenta
Pela mágica do dia
Que independeria da gente pensar
Não me fale do seu medo
Eu conheço inteira sua fantasia
E é como se fosse pouca
E a tua alegria não fosse bastar
Quando eu não estiver por perto
Canta aquela música que a gente ria
É tudo que eu cantaria
E quando eu for embora, você cantará

Pedaço de mim - Chico Buarque

Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Leva os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus

Rosa dos ventos - Chico Buarque

E do amor gritou-se o escândalo
Do medo criou-se o trágico
No rosto pintou-se o pálido
E não rolou uma lágrima
Nem uma lástima para socorrer
E na gente deu o hábito
De caminhar pelas trevas
De murmurar entre as pregas
De tirar leite das pedras
De ver o tempo correr
Mas sob o sono dos séculos
Amanheceu o espetáculo
Como uma chuva de pétalas
Como se o céu vendo as penas
Morresse de pena
E chovesse o perdão
E a prudência dos sábios
Nem ousou conter nos lábios
O sorriso e a paixão

Pois transbordando de flores
A calma dos lagos zangou-se
A rosa-dos-ventos danou-se
O leito do rio fartou-se
E inundou de água doce
A amargura do mar
Numa enchente amazônica
Numa explosão atlântica
E a multidão vendo em pânico
E a multidão vendo atônita
Ainda que tarde
O seu despertar

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Não é o tempo de hoje que quero - Kleber Nunes


Não é o tempo de hoje que quero
Do alto, tenho certeza disso
Tempo de solidão
De muitos carros na rua
Muitas pessoas vagando
Muitos rostos vazios.
Lagartos correndo atrás dos rabos
Metas intermináveis
Felicidade substituída por um novo perfume.

Não é o tempo de hoje que quero
Quero um tempo que nunca pisei
Um tempo que só visito em pensamento
Um tempo com menos projetos
Com menos de tudo que vejo do alto pela janela
Onde eu possa pisar no chão descalço
Ascender fogueiras
Contemplar as estrelas
E ter como único projeto acordar vivo
Ser útil ao universo
E ser feliz.