Tão intensa é
A maré das circunstâncias
Um vai e vem incessante
Assim como as ondas do mar
Tão imprevista é
A vida a cada instante
Dadivosa e sorrateira
Tão sem receita é
Cada passo da jornada
Tudo é possível e complexo
Tudo pode ser nada
Tão glorioso é
Não ter mapa, trilho ou cabresto
Morrer sem aviso prévio
Viver e poder amar
Tanto quis ser adulto
De repente cá estou
Que saudade da infância
Quanta coisa lá ficou
Ficou lá a inocência
E também o despertar
Ficou tudo tão distante
Impossível de alcançar
Do futuro nada sei
Do presente eu sei contar
Do passado eu me recordo
De sorrir e de chorar
Sou as marcas do passado
Os desatinos de hoje também
Sou meus sonhos do amanhã
Atemporal e me convém
Todos estão certos e também equivocados
Na essência do pensamento e nos escaninhos da alma
É que residem as verdadeiras intenções
O pouco que enxergamos é angustiantemente impreciso
Quão simplista tornou-se
O anseio social por respostas objetivas
Isso ou aquilo
E quanto mundo tem sido ignorado entre uma coisa e outra
Realmente a liberdade é algo que assusta
E reduzir as possibilidades parece acolher e reduzir a angústia
Exercer o direito de pensar e agir livremente
Exige olhar para dentro e ter aversão a covardias convenientes
Viver é complexo
Sobreviver é mais simples
Entender o complexo exige consciência, esforço e burila a alma
Optar pelo simples é uma opção, assim como o resultado dessa escolha
E quando o passado fica cada vez mais distante
O presente, um labirinto onde nos perdemos
E o futuro uma estrada sinuosa sem sinalização, interrompida sem aviso
Onde repousar a alma?
Se as recordações se dissipam ou escravizam
Se o hoje exige resiliência a todo instante, sem alternativa de esmorecer
Se não sabemos nada do que está por vir
E ainda assim amamos e planejamos a vida
Voltar no tempo e mudar de rumo
Se sim, e os amores de hoje, onde estariam?
Se não, o labirinto de hoje, cruel ou não, é o nosso lugar
E agora?
Como acolher a alma
Permitir que ela nos conduza sem aflições?
Certos de que somos poeira num universo em movimento
Ora aqui, ora em outra morada
De repente tudo mudou?
Acho que não!
As transformações não acontecem por acaso
Aliás, universo e acaso não são sinônimos
A inquisição queimou
A peste negra matou
O vulcão se manifestou
O vírus chegou, e tantos outros o antecederam, e muitos outros virão
Muita coisa aconteceu desde então
Antes mesmo de estarmos aqui
E muita coisa ainda acontecerá
Mesmo depois que formos embora
Somos assim...
Centelhas do todo
Pequeninos
Inquilinos recentes numa moradia que transmuta incessantemente, desde os tempos mais remotos
Somos crianças
Maravilhadas as vezes, assustadas tantas outras
Tateando a vida para compreendê-la
A mercê de movimentos universais que ainda não entendemos
2021 será melhor?
Talvez!
Aplaudimos e comemoramos quando entendemos que as coisas deram certo
Do contrário, lamentamos e procuramos culpados
2020 nos impôs muitas reflexões
Como é nobre pensar!
Conhecemos um pouco mais de nós mesmos
Privilégio para uns, tragédia para outros, aprendizado para todos
O que nos resta então!
Além de aproveitarmos cada oportunidade para evoluir
E mesmo que pressionados pela dor e a angústia de tantas incertezas
Não desperdiçarmos o momento, e assim como o universo, transmutarmos
De repente
O passado ficou extremamente distante
O presente foi subjugado
E o futuro tornou-se incerto
2020 foi assim
As angústias foram se sobrepondo
Adaptamos a alma para suportar tanto sofrimento
Mas a dor foi criativa e incansável
Contudo, houve acalanto
A esperança não retrocedeu
A fé não cedeu
E a resiliência não hesitou em estabelecer-se
Permitimos que a criatividade aflorasse
Fomos Eros desejando intensamente a cura
Fomos Philia valorizando como nunca a presença
Fomos Ágape exercitando compaixão
2021 está chegando
Ainda impregnado de um ano chacoalhado pelo universo
Repleto de incertezas
De sonhos, ressignificações e cura
As vezes...
Não falta esforço
Apesar dos que creem no acaso
E se escoram nas providências divinas
As vezes...
Não se trata do que falta
A penumbra está no que sobra e escapa entre os dedos
Num turbilhão de estímulos modernos
O mundo tornou-se assim...
Um emaranhado de informações desconexas
Distantes do conhecimento
E ainda mais distantes da sabedoria
Muitas distrações
Pouca alma presente
Tantas opções
Quase nada de coerente
Quão oportuno é o momento
De respirar antes de seguir
Acolher o silêncio com serenidade
E buscar evoluir
Afiar o machado da mente
Cuidar da saúde mental
Limpar o terreno, extrair o veneno
Focar no que for vital
